30 maio 2007

Educando seus Stakeholders

por Shane Diffily

Mesmo que machuque admitir isto, a maioria das decisões importantes no desenvolvimento de websites não são feitas por profissionais de design. Elas são feitas pelos donos do negócio e gerentes que nos contratam. Afinal, são eles que têm o dinheiro, então é justo que eles definam as prioridades de web.

Infelizmente, esta situação tem uma grande desvantagem. Ainda que estas pessoas tenham uma boa intenção, elas geralmente estão totalmente desatentas aos fatos que deveriam e realmente influenciam a tomada de decisões na web. O triste resultado é que escolhas de investimento equivocadas são feitas regularmente. Por exemplo, um executivo que ignora o potencial de dispositivos móveis pode aceitar um site que é inacessível em telefones celulares. Do mesmo modo, uma aplicação que é construída sem a consciência das leis digitais pode acabar custando uma pequena fortuna em multas judiciais.

Preparando a cena

Aqueles de nós que fazem suas carreiras em planejamento de sites têm a obrigação de ajudar tais pessoas. Nosso objetivo deve ser equipar os tomadores de decisão com o conhecimento que eles precisam para fazer escolhas sensatas e bem informadas sobre desenvolvimento.

O propósito deste artigo é mostrar a você como fazer isso com um simples processo de educação dos stakeholders (Nota de Tradução: termo utilizado em Gestão de Projetos. Pode se traduzido como “responsáveis”). Isto te permitirá explicar os fatores principais que moldam as convenções da web e ajudá-lo a “preparar a cena” para uma futura tomada de decisão.

Os fatores contemplados neste processo incluem qualquer coisa que diga respeito à liberdade de uma empresa de operar online. Para ajudar, eles podem ser categorizados em dois grupos: fatores globais e industriais e fatores gerenciais e de negócio. (Ambos serão explorados em detalhes logo abaixo.)

Em minha experiência, a melhor maneira de “preparar a cena” é organizar um treinamento onde os principais stakeholders são apresentados aos fatores que influenciam decisões relacionadas à web. Os benefícios de seu esforço educacional se tornarão óbvios assim que o treinamento terminar. Você verá que o discernimento dos stakeholders estará bem mais informado e seguro do que antes; por fim, melhores decisões surgirão das discussões pós-treinamento

Vamos dar uma olhada nos principais fatores que seus stakeholders podem estar perdendo.

Fatores Globais e Industriais

Fatores globais e industriais são aqueles que direcionam o desenvolvimento web ao mais alto nível. Ainda que estes itens geralmente estejam sob a influência somente de grandes empresas, as menores podem ter uma voz se elas agirem em conjunto, por exemplo, através de uma organização industrial. Eles incluem:

  • A Lei
  • Tecnologia
  • Cultura e sociedade digital
  • Melhores práticas
  • Tendências de indústria e mercado

A Lei

Já que a “ignorância não é defesa”, o cumprimento da lei deve ser prioridade em atividades online. Leis de internet abordam a legislação, diretivas governamentais e julgamentos que têm o poder de influenciar o desenvolvimento.

Felizmente, um conjunto padrão de regulações da web subiu para um nível global. Se você conseguir convencer seus stakeholders a prestarem atenção neste conjunto de regras, pode acreditar que um patamar mínimo de legalidade será atingido.

Dentre as mais conhecidas destas regras estão aquelas relacionadas aos direitos autorais. Falando de forma simples, seu cliente deve se certificar de que todos os gráficos, conteúdo e código foram corretamente licenciados para reprodução (ou produzido “em casa”) antes do uso.

Regulações de privacidade e segurança precisam de uma consideração similar. Endereços de e-mail e detalhes pessoais não podem mais ser utilizados sem permissão. Muitos países possuem longas listas de legislações que controlam a maneira como você consegue, armazena e explora tais informações.

Numa ramificação parecida, diretivas sobre e-commerce exercem um importante papel na regulação de atividades da internet – particularmente diretivas que tratam de direitos do consumidor e impostos internacionais. Na verdade, leis de estelionato online estão se provando difíceis de gerenciar para um público internacional.

Controles sobre a liberdade de imprensa também criam uma série de dilemas gerenciais. Regras sobre calúnia e difamação, racismo e preconceito, e material adulto e obsceno colocam parâmetros significativos sobre o que você pode e (mais importante) não pode publicar. Isto é especialmente relevante se seus stakeholders querem explorar conteúdos gerados por usuários, como em wikis e grupos de discussão.

Finalmente, se seu empregador opera num setor governamental, você não deve esquecer da acessibilidade e outros requisitos que são importantes nesta área, como a legislação de línguas oficiais.

Tecnologia

Algumas equipes de projeto têm feito presunções equivocadas sobre o impacto da tecnologia em sua tomada de decisão – particularmente sobre a frequência de mudanças, que geralmente é subestimada. Se uma escolha de desenvolvimento é feita sem o conhecimento de novas tendências, isto pode levar a uma experiência rapidamente obsoleta para os usuários. Para neutralizar este mal, você deve apresentar aos stakeholders, principalmente aqueles com pouca experiência em web, as tecnologias emergentes e as oportunidades que elas criam. Alguns itens a serem vistos atualmente são:

  • Web 2.0 e as experiências enriquecidas que ela está criando.
  • A habilidade de usar a internet usando dispositivos móveis.
  • O potencial multimídia da banda larga.

Cultura e sociedade online

Mesmo que os efeitos da “revolução da internet” sejam muito exaltados de vez em quando, não há dúvidas de que a sociedade se adaptou bem aos seus benefícios. Isto se reflete nos diferentes públicos que continuam a aparecer na rede. Você deve perder um tempo para explicar essas mudanças aos tomadores de decisão, para que eles possam entender o contexto em que seu próprio site funciona. Por exemplo:

  • Quantas pessoas possuem acesso à internet no seu país, região ou mercado?
  • Que tipos (e populações) de grupos de interesse especial devem ser considerados, por exemplo, idosos, portadores de deficiência, estrangeiros, etc?
  • Como a web é usada para algumas tarefas ou hobbies, como ir ao banco, fazer amigos, compartilhar fotos, fazer telefonemas, etc?
  • Existe apoio do governo para projetos que estimulam a “inclusão digital” – ou seja, projetos que facilitam a entrada de pessoas em comunidades desfavorecidas ao mundo digital?

Melhores práticas

Melhores práticas são o conjunto de convenções de desenvolvimento usadas por profissionais que criam conteúdo e serviços para a web. Apesar de não existir nenhum “pacto” sobre estas práticas (mesmo com o esforço do W3C), os leitores do ALA devem estar familiarizados com algumas:

  • Preferência para o XHTML como a linguagem de marcação da web.
  • CSS para apresentação do conteúdo web.
  • ECMAScript para interatividade no cliente.
  • As Regras de Acessibilidade no Conteúdo Web (WCAG) do WAI.

Você deve descrever os benefícios destes padrões para os stakeholders: como eles suportam acessibilidade, tornam a manutenção dos sites mais fácil, e habilitam a portabilidade de dispositivos. Com um pouco de sorte, isto deve ser o bastante para convencê-los de que um alto nível de comprometimento com os padrões é de seu interesse, mesmo que isto precise de uma verba extra para treinamento da equipe.

Tendências de indústria e mercado

Esta categoria trata do uso da internet dentro de uma indústria ou mercado específico. Dentre os elementos que você deve revisar com seus stakeholders estão as tendências emergentes, bem como um comparativo dos pontos fortes e fracos da concorrência. Por exemplo:

  • Quantos concorrentes estão online?
  • Que modelos de negócio eles usam – ou seja, como eles fazem dinheiro?
  • Eles estão crescendo? Podem ser usados como referência?
  • Há alguma literatura que recomende melhores práticas de web para esta indústria?

Fatores gerenciais e de negócio

Fatores gerenciais e de negócio representam os limites dos quais uma empresa tem o poder de mudar por si só. Na verdade, a influência desses limites nas tomadas de decisões costumam ser mais profundos que os itens já vistos acima. Isto porque agora você tem a chance de ajudar seus stakeholders a ajustar o ambiente para tornar o desenvolvimento mais fácil.

Os três fatores mais importantes a serem explorados são:

  • Pesquisa do website
  • Práticas e políticas da empresa
  • Gerenciamento do website

Pesquisa do website

Como muitos de nós sabemos, a principal razão do fracasso de muitos sites é que verbas inadequadas são alocadas para o desenvolvimento e manutenção. Para evitar isso, você deve dar aos stakeholders uma idéia clara dos compromissos financeiros necessários para garantir um nível mínimo de sucesso.
Uma maneira de explicar os custos de manutenção é relacioná-los a diferentes tipos de website. Isto pode ser feito usando o conceito de “escala do website”. A Escala do Website tem o objetivo de classificar os sites em termos de três parâmetros:

  • Tamanho: o esforço necessário para produzir e manter o conteúdo.
  • Complexidade: o tipo de tecnologia usada para hospedagem e gerenciamento de conteúdo.
  • Atividade: os níveis de tráfego do site.
Os três níveis da escala do site
  Website grande Website médio Website pequeno
Tamanho Muito grande Médio Pequeno
Complexidade Transacional Dinâmico Básico
Atividade Muito tráfego De médio a grande Baixo
Exemplo www.amazon.com www.alistapart.com www.diffily.com

Desta maneira, você consegue mostrar que os custos para gerenciar um site de grande-escala são muito maiores que de um site pequeno. Consequentemente, os stakeholders podem estimar o retorno que eles terão para os diferentes níveis de investimento – e evitar pedirem o impossível.

Práticas e políticas da empresa

Políticas são o código legal de uma empresa. Elas são as regras pelas quais a empresa limita o comportamento de seu negócio e de seus funcionários. Você deve pedir que seus tomadores de decisão estudem estes princípios para que eles entendam os limites que eles impõem à operação. Se eles aparentemente causarão problemas durante o desenvolvimento, eles podem ser mudados? Se existirem falhas, uma nova política pode ser criada? Algumas das políticas mais populares a serem consideradas incluem:

  • Política de privacidade: as regras pelas quais as informações de consumidores são conseguidas e utilizadas.
  • Política de segurança: os mecanismos de criptografia e armazenamento utilizados para os dados.
  • Política de marca: os tipos de imagens, cores e outras características que podem ser utilizadas no design.

Gerenciamento do website

Websites fracassados geralmente sofrem de uma falta de clareza sobre como as decisões são feitas. Isto fica mais evidente em grandes empresas onde os julgamentos podem ter uma motivação política, ao invés de serem dirigidas pelos objetivos do site. Como resultado, você precisa rever uma série de sistemas de controle com um stakeholder superior para conseguir chegar a um acordo apropriado. Isto inclui:

  • Estruturas e procedimentos de manutenção: a organização e regras pelas quais as operações funcionam, por exemplo, trabalho em equipe, padrões, etc.
  • Papéis e responsabilidades: os perfis necessários numa equipe web e suas responsabilidades, por exemplo, editor, designers, programadores, suporte técnico, etc.

Hora da decisão

Agora deve estar claro que uma gama de fatores pode influenciar a tomada de decisões de um website. Mesmo assim, uma simples reunião de cerca de uma hora pode ser o bastante para explicar estes itens em detalhes suficientes para que os stakeholders entendam; a idéia não é transformar seus gerentes e clientes em experts – é simplesmente alertá-los sobre a influência que eles têm no desenvolvimento e os fatores que todos vocês vão ter que considerar.

O ideal seria se organizar par que este treinamento ocorra logo no início de um projeto, antes que planos reais sejam feitos. Fazendo isso, você garante que discussões posteriores se mantenham informadas, focadas, e – mais importante – realísticas.

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Este artigo foi publicado originalmente na edição 237 da A List Apart e pode ser acessado aqui.

Traduzido por Luciano Rodrigues.